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Fadas Ibéricas - Trasgos

mar. 16, 2024 0 comments


Quando tudo nos corre mal, é bem possível que tenhamos um espírito traquina atrás de nós. Na Península Ibérica, este espírito é um Trasgo. 

Trasgos são criaturas misteriosas da mitologia ibérica. O seu registo está mais cingido a Portugal, e partilham muitas características com o Duende, de que falaremos no próximo artigo sobre Fadas Ibéricas. Para Vanessa Fidalgo, na obra "Seres Mágicos em Portugal", as duas palavras são apenas sinónimos, e descreve-os da seguinte forma: "Usam gorros vermelhos, e possuem poderes sobrenaturais. São refilões, rebeldes, de pequena estatura, nariz arrebatado, tez rugosa, e o povo chama-lhes trasgos ou maruxinhos, que é como quem diz, duendes!"

Trasgos, Maruxinhos e Duendes são sem dúvida semelhantes, mas têm diferenças mínimas que podem ser identificadas e ajudar-nos a lidar com eles melhor no nosso dia a dia. Estas criaturas têm todas semelhanças a outras criaturas de tamanho diminuto, conhecidas por fazer traquinices da mitologia Celta e Nórdica. Para facilitar a nomenclatura, vamos considerar estas criaturas independentes umas das outras, apesar das suas semelhanças (podemos ainda sugerir considerar Duende uma categoria ampla, que inclui as categorias especificas de Trasgos, Maruxinhos, Duendes, Labregos, Fradinhos, etc.). 

Trasgos, reguilas do campo

Podemos colocar Trasgos na categoria de Fadas que controlam o destino dos outros, apesar de o fazerem com ações muito pequenas. Estes homenzinhos não procuram trazer agoiros ou um destino final, apenas diversão. São traquinas por natureza e adoram criar os pequenos incómodos na vida quotidiana. Lendas sobre estas criaturas são mais comuns em áreas rurais - daí as suas partidas serem em volta do modo de vida rural. Trasgos são criaturas especialmente associadas ao verão e ao campo, sendo uma das suas partidas principais fazer com que agricultores fiquem tontos no meio do campo, perdendo-se. 

Esse não é o seu único espaço, sendo também comum encontrar Trasgos em casas, moinhos e presos a pessoas. Em casa, são conhecidos como "Trasgos Louceiros", que, segundo o registo de Alexandre Parafita em "Mitologia Popular Portuguesa", são criaturas que manipulam a loiça da casa, criando ruído de loiça a bater e atirando-a para o chão. Nos moinhos, podem revoltar-se contra a pessoa que os opera, e fazê-los inoperáveis, sendo muito ligados ao pão. Quando estão presos a pessoas, fazem com que pequenas desgraças aconteçam na sua vida, como nós no cabelo, chaves que desaparecem, buracos na roupa. Este tipo de Trasgo traquinas que traz desgraças pode ser identificado pelo seu barrete vermelho, uma característica que partilha com os Redcaps escoceses. Partilha semelhanças com muitos outros traquinas diminutos de mitologias irlandesas e escocessas, o que nos sugere que podem ter a sua origem nos Celtas, daí a sua presença também na Península Ibérica. Fidalgo compara-os aos Far Darrig ou Leprechaun Irlandeses. 

Existe um tipo de Trasgo que cumpre um Fadário, mais acreditado na Galiza. Quando crianças muito jovens morrem, podem tornar-se em Trasgos, a razão dada sendo a sua inocência, que não permite que a sua alma seja julgada, ou o facto de não serem batizada. Quando isto acontece, a alma da criança fica agarrada à casa onde vivia ou à pessoa que cuidava dela, num estado permanente de brincadeira. 

Seja qual for o tipo de Trasgo com que lidamos, caos com certeza há de se suceder. No entanto, nem tudo está perdido, pois são as Fadas com que mais facilmente conseguimos lidar. 

Evitar traquinices

Se descobrirmos um Trasgo próximo de nós, o que podemos fazer para evitar as suas traquinices repletas de destruição? Quando o assunto é Duendes, Maruxinhos, Trasgos e Labregos, espíritos traquinas, existe um equilíbrio entre o medo, o respeito, e o poder. Devemos ter medo, pois estamos perante seres liminais com capacidades misteriosas e apenas superficialmente compreendidas por nós. No entanto, temos de ter o mesmo nível de respeito que temos sob qualquer ser mágico. Ao mesmo tempo, ter a noção que também temos poder sobre eles. Não é ao acaso que chamamos uma criança a portar-se mal de "trasgo" - é porque, às vezes, o mais fácil é pensar que estamos a lidar com os espíritos infantis do mundo feérico, e falar com eles como crianças. Simplesmente ignorar, ralhar, ou pedir para o Trasgo parar, pode funcionar e parar as traquinices. Mas, tal como as pessoas, cada um deles tem a sua personalidade, e temos de adaptar as nossas ações à mesma.

O primeiro a fazer, é ter uma conversa. Falar em voz alta, para o Trasgo, e tomar nota do que acontece à nossa volta. Pedir para parar de causar angustias, primeiro gentilmente. Se o Trasgo se mostrar prepotente, poder-se-á levantar-se a voz e mandar o Trasgo voltar para o Outro Mundo. Expressando abertamente que o Trasgo não é bem vindo, ele não ficará. No entanto, também se pode fazer um contrato com o Trasgo, e dar ofertas frequentes para manter a paz. Um contrato com um Trasgo pode ser algo tão útil, como volátil. Os Trasgos são enganadores por natureza, e vão tentar encontrar buracos no contrato que possam utilizar para causar caos. É preciso ser muito claro com as suas intenções e ter em conta tudo o que pode correr mal. Em suma, para fazer um contrato com um Trasgo, é preciso pensar como um Trasgo. 

Magia com Trasgos

Trasgos, tal como Duendes, são muito associados a Bruxas, como seus criados diabretes. Aqui destacamos uma diferença essencial no seu serviço: os Duendes são mais registados a fazer tarefas caseiras (encontrar objetos, arranjar roupa, etc.) e os Trasgos, tarefas nefastas. Ou seja, um Trasgo está no seu elemento, quando lhe pedem para fazer traquinices. Podemos fazer um contrato com um Trasgo em que lhe peçamos apenas para parar com a sua destruição, tal como podemos redirecionar essa destruição para outro espaço. Digamos, o espaço de alguém que também esteja a ser um verdadeiro Trasgo na nossa vida. Trasgos são pequenas pragas andantes. Especialmente quando conhecemos o Trasgo com o qual temos contrato e sabemos que tipo de traquinices preferes, podemos trazer pequenos desconfortos à vida de alguém. Emaranhar os cabelos, roubar botões e moedas, partir loiça, são tudo pequenos males para incomodar quem achemos que os mereça. Se soubermos que o Trasgo faz males maiores, é melhor considerar com cuidado a nossa decisão. Claro, reforçando de novo o cuidado na escrita do contrato com o Trasgo, estipulando sempre que tipo de traquinices é que ele pode fazer, e até quando - temos de manter sempre a habilidade de pedir ao Trasgo para parar.

Isto não é de todo para motivar quem lê este artigo a mandar Trasgos "a torto e a direito" a toda a gente que lhes incomode minimamente. Não se vai mandar um Trasgo a alguém porque nos passou à frente na fila do supermercado. Existe razão pela qual este ser mágico foi tão associado aos Diabretes, para além dos Duendes. Mas como com todas as pragas, é sempre bom saber dominar todo o tipo de magia - até para sabermos também quando um Trasgo pode ter sido enviado por alguém. Deixo aqui um exemplo de um contrato que se pode fazer com um Trasgo, bem como passo a passo para identificar as suas intenções. Recomendo a utilização de um método de divinação a quem tenha a sua intuição para interação com Fadas menos treinada.

1. Reconhecer a presença do Trasgo. "Eu sei que está aqui. Sei que é a causa da destruição à minha volta"

2. Conhecer as intenções do Trasgo. "Alguém te enviou?"

    a. Se a resposta for sim, dizer "Volta para quem te envia, e leva contigo todas as tuas traquinices para a pessoa delas desfrutar"

    b. Se a resposta for não, poderá proceder à formação de um contrato

3. Saber a personalidade do Trasgo. "Qual a traquinice que mais aprecia?" (nota: o Trasgo pode mostrar-te fisicamente, por isso, podes saltar esta pergunta se não te sentires confortável)

4. Escrever o contrato num papel:

        Ser traquinas que entrou no meu espaço,

        Assim te peço para cessares as tuas partidas

        Que elas não venham na minha direção ou dos meus entes queridos

        Que não tragas sofrimento, incomodo ou desgosto,

        Em troca deste pão, mel e cerveja frescos

        Que te darei toda/os (inserir mês/dia da semana) em troca da paz e sossego 

    Diz o contrato em voz alta, e no fim, assina com o teu nome de bruxe (nunca com o nome verdadeiro)

5. Dá oferta de pão, mel e cerveja, a oferta mais apreciada por Trasgos. 

Agora, tens um Trasgo pacifico no teu espaço. Podes fazer um novo contrato para enviar o Trasgo a alguém, se assim decidires, pois Trasgos podem ficar inquietos quando estão parados. Se as traquinices voltarem, considera banir o Trasgo, para assim todos conseguirem seguir o seu caminho. 



@rosasininho Este vídeo: Trasgos | Próximo: Duendes 🧝#mitologiaportuguesa #tiktokportugal #fadasibéricas ♬ Witch Familiar (Classical) [Classic](143628) - dice

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